terça-feira, 10 de novembro de 2009

Pode parecer estranho


Dois discos lançados no mesmo ano, embora completamente diferentes são ligados por uma música e pela mesma concepção de mudança. O “The Eternal” do Sonic Youth parece marcar um compromisso menor da banda com o experimentalismo, as músicas usam a potência da voz da pequena Kim Gordon e mantém os poderosos riffs de guitarra que sempre foram a marca registrada da banda. Já o Chiaroscuro da Pitty inovou na busca por novos sons e explorou mais a voz dela que pode ser doce e alta em uma mesma faixa. São diferentes e parecidos, principalmente nos primeiros acordes de "8 ou 80" e a introdução de "What We Know".

Outra coisa presente nos discos são as referências literárias, enquanto a Pitty abusa nas letras de várias músicas citando todos os livros que deveriam ser obrigatórios para os adolescentes do mundo, o Sonic Youth usa a idade de todos eles para se revelarem em outros escritos.

O disco do Sonic Youth funciona tão bem que faz a banda parecer outra ao vivo, as canções tem uma sonoridade mais simples que chega sem grandes problemas aos ouvidos desacostumados, parecem contemporâneos do que faziam em 2004 no Sonic Nurse. Os anos fizeram bem ao Sonic Youth. Será esse o anúncio de uma nova busca? O momento é acertar pelo simples sem abandonar a essência? O vocal rasgado da Kim no começo da "Sacred Trickster" me lembra a Allison nas suas melhores interpretações com o The Kills.

O Sonic Youth parece deixar a obrigação revolucionária que carregamos na juventude para chegar a uma maturidade tranquila. Sem necessidade de se firmar depois de tantos anos de compromisso com a música, com o experimental, com o novo, o “The Eternal” chega anunciando que o fim é um novo começo. Sonic Youth pode deixar de ser aquela banda complexa de muito tempo para se tornar um rock simples. O bom é sentir que eles ainda são fieis aos instrumentos e não se renderam aos computadores nesse novo jeito de "fazer música". Tocam e cantam, o Sonic Youth que traduziu gerações na busca por autoconhecimento parecem ter encontrado um pedaço de paz.

O Chiaroscuro da Pitty é mais complexo do que os trabalhos anteriores, quase todas as músicas ficam melhores se ouvidas com o fone, o hit "Me adora" destoa do resto e dá lugar a "Água Contida" com o preciso violino de Hique Gomez (Tangos & Tragédias). Esse álbum merece ser ouvido com todos os preconceitos desligados. A coragem da Pitty é contrária a do Sonic Youth, que facilitou a música, ela parece ter desdenhado o mercado em busca do som. Embora os fãs ainda continuem os mesmos, a problemática se encaixa melhor na vida dos mais crescidos: das mulheres que se dividem entre trabalhar, cuidar dos filhos e ainda procurar tempo para se divertir em Desconstruindo Amélia. Pitty retratou essa multifacetada juventude crescida do século 21. Acabaram os hinos adolescentes, aquela necessidade de ouvir música alto até os pensamentos se calarem para dar lugar a calma. Ouvir os discos antigos e parar em “Água Contida” faz sentir como se tivesse trocado uma balada alucinante por uma noite com vinho e bons amigos. Saiu o caos absoluto e entrou um vocal leve em “Só Agora”, ainda que “Equalize” e “Na sua estante” já tivessem mostrado esse lado romântico da cantora, é a evolução dos arranjos que chamam a atenção no Chiaroscuro.

A minha leve esperança é que todos os muitos adolescentes que gritam, fazem coro de “eu te amo” e vibram com a presença da Pitty procurem entender as milhares de referências despejadas por ela, desde o trocadilho de "Todos estão Mudos" com "Todos estão Surdos" do Roberto Carlos até os livros que povoam as letras.

Ao que tudo indica o Sonic Youth atingiu a serenidade da velhice enquanto a Pitty chegou ao mundo adulto. Novos tempos, bons tempos.







O “The Eternal” foi direto pro topo dos meus discos desse ano. E que ano de CDs bons: o novo do arctic, o da ScarJo com o Pete Yorn, o The Kills (embora seja do ano passado), o novo do Morrissey, Muse... Só faltou Radiohead, Fiona Apple e Chico (amor) lançarem coisas novas.

2 comentários:

  1. Perfeito. Enquanto o Chiaroscuro faz sentido para todos aqueles que já conhecem as referências citadas no album, é uma porta para esse novo universo para quem ainda não conhece.

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  2. Uma coisa eu posso dizer sobre a Pitty, ela amadureceu e está fazendo seus fãs amadurecerem também. Eua acompanho desde seu primeiro trabalho, eu ainda era uma criança, hoje tenho 18 e muito orgulho de dizer que sou fã dessa mulher e de toda sua obra. Ela consegue me levar a pensar e me enlouquece toda vez que a escuto. E sempre que faço tenho uma visão renovada de tudo que ela escreveu, dos seus covers e até mesmo de suas parcerias... Ela se garante.

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